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Luthier Valderrama: o grande mestre da harmonização de ressonâncias do violão

Postado em Luthiers e violões em 12/01/2024

Luthier Valderrama: o grande mestre da harmonização de ressonâncias do violão - Foto: José Valderrama no seu ateliê - Arquivo particular

(José Valderrama no seu ateliê - Arquivo particular)

Por Elcylene Leocádio

José Valderrama pode ter esquecido o que D. Júlia, sua mãe, lhe pediu para comprar na mercearia perto de casa, mas guardou para sempre a emoção que sentiu ao entrar naquele lugar e se deparar com um amigo da família, com um pé apoiado em um banquinho, tocando Abismo de Rosas. A cena marcou para sempre o moleque de pouco mais de dez anos, que já brincava de tocar violão com os amigos. “Eu fiquei louco. Passei a estudá-la sem parar e em pouco tempo sabia a música inteira de cor”.

A partir daquele momento Valderrama trilha dois caminhos: os estudos técnicos, o trabalho formal em uma grande empresa de automóveis e, em paralelo, a música e o instrumento “violão”.  Mais adiante, esses caminhos se encontram e se mesclam no ofício da luteria. Foi uma longa trajetória até Valderrama se tornar um dos grandes luthiers brasileiros e um dos maiores especialista na tecnologia da frequência fundamental da caixa harmônica (tampo, fundo e cavalete). Ele está construindo um violão top de linha (de R$ 24 mil) para a campanha da Rifa do Acervo Violão Brasileiro.

CLIQUE E PARTICIPE DA RIFA

O modelo doado por Valderrama para a Rifa é similar ao que fez para o grande violonista Odair Assad. É um modelo Gran Solista com frequência fundamental em Mi bemol e tampo de abeto europeu. As laterais, fundo e cavalete são de jacarandá do Espírito Santo (extraída de uma árvore centenária). E mais: braço de cedro rosa; escala de ébano. O verniz é goma laca (tampo, lateral e fundo) e PU (no braço). As tarraxas e a roseta são autorais de José Valderrama. O case está incluso nesta rifa. O valor do bilhete é R$ 120,00 e está sendo vendido na Loja Violão Brasileiro.

Para quem já participou de rifas anteriores, mas não teve tempo de aproveitar o desconto de R$ 20 em dezembro devido ao recesso, o Acervo ampliou o prazo de validade do cupom até 28 de janeiro. Quem já participou da rifa mas ainda não recebeu a mensagem, recomendamos consultar a caixa de promoções ou Spam. Ou então escrever para o Acervo pelo email contatos@violaobrasileiro.com.br ou pelo whatsapp (11) 97615-8514. O violão estará finalizado em março de 2024, quando será feito o sorteio e a entrega ao vencedor ou vencedora.

Luthier Valderrama: o grande mestre da harmonização de ressonâncias do violão - Foto: Odair Assad e José Valderrama - Arquivo particular

(Odair Assad e José Valderrama - Arquivo particular)

Engenharia

Antes de se tornar esse grande mestre da harmonização de ressonâncias do violão, Valderra trilhou um passo a passo bem particular. O curso de engenharia não foi concluído porque sua expertise no trabalho o levou a viajar pelo país assessorando outras equipes e colegas. Mas foi justo esta experiência que lhe deu régua e compasso para avançar na pesquisa sobre a construção de violões, na criação de modelos de estudo e outras coisas mais que somente conversando com ele se pode imaginar.

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Aos 13 anos, Valderrama faz um teste para o curso de “ajustador mecânico”, no Senai. Aprovado, ele estuda com patrocínio da Companhia Antártica de Bebida, onde deveria trabalhar após conclusão do curso. Mas, antes de ser efetivado como funcionário da empresa, ele pede ajuda dos pais para pedir dispensa do compromisso, pois queria estudar “ferramentaria de moldes plásticos”, curso que o leva a trabalhar na General Motors (GM), onde permaneceu 18 anos.

Também na adolescência Valderrama entra no conservatório de música e tem aulas particulares. Em um dado momento ele se dá conta de que nunca tinha visto um violão de luthier. Comentou o fato com seu professor, José Augusto Silva (já falecido), que também não conhecia aquele universo, mas sabia quem poderia ajudar seu aluno e recomendou que ele procurasse ninguém menos que o lendário Ronoel Simões (1919-2010). E foi lá, nos saraus de Ronoel, um ambiente descrito como “mágico” por quem o frequentava, que ele conheceu Manoel Andrade, um luthier experiente e generoso, disposto a lhe mostrar “o caminho das madeiras”.

Luthier Valderrama: o grande mestre da harmonização de ressonâncias do violão - Foto: Ronel Simões

(Ronel Simões)

José Valderrama é paulistano e mora em Santo André. É casado com Solange, pai de Guilherme e de Samira. Primeiro filho homem, ele recebeu o mesmo nome do pai, um descendente de espanhóis, que no dia 6 de janeiro de 2024 completou 99 anos de idade e ainda chama o primogênito “Zezinho” a sair para pescar.

Ao conversarmos sobre sua vida pessoal ou profissional, percebe-se que Valderrama gosta do verbo “fazer”. Ele está sempre fazendo alguma coisa e esse jeito de ser parece ter aprendido com o pai, que construiu sua casa nas horas vagas com ajuda dos filhos. Até hoje, a semana de Valderrama só teve “dias úteis”. Durante anos, de segunda a sexta era funcionário da empresa e, nas horas vagas, estava construindo sua oficina, sua casa e seus violões. Estudioso, fazendo cursos ou como autodidata, o que mais lhe atrai são os estudos técnicos, práticos, aplicáveis aos seus interesses.

O trabalho, tendo chegado cedo em sua vida, por volta dos 14 anos, lhe permitiu aposentar-se em pleno vigor criativo e a luteria, que até então era considerada um “hobby”, invadiu de vez o seu cotidiano. A oficina, como a sua casa, desenhadas por ele, já estavam prontas, os equipamentos haviam sido comprados pouco a pouco, as madeiras cuidadosamente escolhidas, algumas centenárias, cheirando a mel, já ocupavam as prateleiras. E os clientes já haviam chegado.

No início da pandemia, como aconteceu com todas as famílias, Valderrama também enfrentou alguns problemas, tensões e mudanças. Pela primeira vez na vida ele foi demitido. Mas, vendo-se aposentado, ele teve a oportunidade de dizer: “não vou procurar outro emprego, agora eu sou um luthier, vou estudar e fazer violões”. E não se falou mais de hobby, mas de sua grande paixão por um instrumento chamado violão e pelo jeito que escolheu para construí-los, que vem pesquisando há 30 anos. E esse jeito agradou muita gente.

Sobre o seu trabalho, o grande violonista e professor Everton Gloeden se refere como um sonho realizado (Programa no 15 da série criada por Oscar Ferreira “A Criatividade Brasileira na Luteria). E aqui, ele se refere à possibilidade de se ter no Brasil alguém construindo violões com a caixa harmônica afinada, uma técnica antiga, que vem de longe, mas que ele conheceu em 1992, na casa de David Rubio, um entusiasta desse processo. Para Éverton, é muito importante para os violonistas terem à sua disposição diversos tipos de violão, pois a escolha de um ou outro depende de cada intérprete mas também do que pede cada obra, do que pede o repertório a ser tocado.

Em três décadas, Valderrama construiu 129 violões, menos de cinco por ano. Pouco? Não parece, se durante todo esse tempo ele trabalhou 8h por dia, fora de casa. Mas ele não joga, nem torce por time de futebol, e sai pouco de casa. Lazer? Diversão? Sim, fazer violões. Mesmo assim, ele não se atribui nada de especial. Faz o que gosta, apenas isso.

Técnica de cada luthier

E do que se trata esse trabalho? Perguntado sobre que tipo violão Valderrama constrói, ele responde: eu faço violões tradicionais. E para ele essa escolha não significa que tenha críticas ou que não goste de instrumentos feitos com outras tecnologias. “Eu não acho que faço violões melhores que os demais luthiers. O melhor violão é o que responde à necessidade, ao gosto, ao interesse da pessoa que vai tocá-lo, do(a) violonista. Pode ser um violão tradicional, moderno, com escala maior, menor, com frequência mais alta ou mais baixa”. O que mais importa para ele, de fato, é dominar a tecnologia que escolheu, é se aprofundar nesse estudo, procurando melhorar mais e mais o seu trabalho.

Luthier Valderrama: o grande mestre da harmonização de ressonâncias do violão - Foto: José Valderrama e Giaccomo Bartoloni - Arquivo particular

(José Valderrama e Giaccomo Bartoloni - Arquivo particular)

Cabe ressaltar que o trabalho de Valderrama se destaca por essa busca, pela qualidade do produto que ele entrega, feito artesanalmente por ele próprio, que até hoje trabalha sozinho; pelos materiais que ele usa e pela busca de um determinado som, de acordo com o desejo de sua clientela, que inclui violonistas de “primeira grandeza” como Odair Assad, Everton Gloeden, Edson Lopes, Fábio Ramazzina, Giaccomo Bartoloni e Salomão Habib.

Curioso, Valderrama também desenvolveu as tarraxas que usa em seus violões e atualmente está trabalhando em um modelo novo para o cavalete. Como disse, Alessandro Soares, aí está mais um hobby de pesquisador.  Mas ele também deseja passar o seu conhecimento adiante. Vamos ver o que virá depois. Um curso de luteria?

Violão afinado

Mas do que se trata esse negócio de afinação do violão?  Alguns falam de “tampo afinado” e Valderrama afirma que não é apenas a frequência do tampo que conta, mas da caixa harmônica como um todo. E isso inclui o tampo, as laterais, o fundo, o cavalete e a região à sua volta. Em resumo, a frequência da caixa harmônica é a resultante das frequências de cada um desses componentes.

Luthier Valderrama: o grande mestre da harmonização de ressonâncias do violão - Foto: Tarraxas construídas por José Valderrama - Arquivo particular

(Tarraxas construídas por José Valderrama - Arquivo particular)

Valderrama pesquisou até atingir o seu objetivo: poder repetir o som de um violão feito por ele, ou por outro luthier. A partir dos instrumentos que dispõe e da técnica que desenvolveu ele pode medir a frequência da caixa harmônica de um determinado violão e construir um similar, mesmo em se tratando dos instrumentos mais tradicionais e conceituados como um Torres ou um Hauser.  Não é mera uma cópia do instrumento, mas de um novo violão que produz o mesmo som daquele que ele avaliou.

Rifas do Acervo

As rifas realizadas em 2021 (com um violão top de linha Lineu Bravo) e em 2022 (com um Cleyton Fernandes Modelo Concert Lattice) garantiram a existência do Acervo Violão Brasileiro, pois o portal depende de financiamento coletivo. A Rifa foi pensada como ação que beneficia a todas as pessoas envolvidas: é uma estratégia de financiamento coletivo do site; está alinhada com o propósito de divulgar a obra de luthiers e promover o debate sobre o tema e por fim, dá a oportunidade a quem participa de concorrer a um violão de luthier, uma peça valiosa, de altíssima qualidade.

Luthier Valderrama: o grande mestre da harmonização de ressonâncias do violão - Foto: Violão José Valderrama - Arquivo particular

(Violão José Valderrama - Arquivo particular)

Em setembro de 2024, o Acervo Violão Brasileiro completará 10 anos de atividades ininterruptas, oferecendo acesso gratuito a um conteúdo de excelência, com uma curadoria rigorosa. Este trabalho tem como objetivo central produzir e preservar a memória da cultura, da música, dos compositores, intérpretes e luthiers do Brasil.

Serviço:

Rifa Violão José Valderrama – Modelo Gran Solista

Valor do bilhete: R$120,00 Clique e compre aqui

Sorteio: Março de 2024, ao vivo, no Youtube do Acervo Violão Brasileiro (data a definir)

• Valor de venda: R$ 24 mil

• Tampo: Abeto Europeu

• Fundo, lateral e cavalete: Jacarandá do Espírito Santo

• Escala: Ébano

• Braço: Cedro rosa

• Verniz: Goma laca (tampo, lateral e fundo) e PU (braço)

• Tarraxas: José Valderrama

• Case incluso

Ajude a preservar a memória da nossa cultura e a riqueza da música brasileira. Faça aqui sua doação.