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Hélio Delmiro e a influência que exerceu nos violonistas e guitarristas

Postado em Coluna Conrado Paulino em 26/06/2025

Por Conrado Paulino

O violonista, guitarrista e compositor Hélio Delmiro (1948-2025) era um gigante no cenário musical brasileiro. A trajetória dele foi especialmente brilhante entre o fim dos anos 1960 e as décadas de 1970, 80 e 90, era o preferido por 10 em cada 10 artistas, sejam cantoras, instrumentistas ou compositores, não só do Brasil. Todos os guitarristas e violonistas brasileiros da música instrumental e do jazz foram fortemente marcados pela fluência, musicalidade e sofisticação de Hélio.

Seja como sideman ou como solista, Delmiro se destacava principalmente como improvisador e como virtuose do chamado chord melody, um estilo desafiador em que o instrumentista precisa concatenar a melodia, a harmonia e o baixo simultaneamente de forma em grande parte improvisada.

O disco Emotiva (1980) é um marco na guitarra e no violão brasileiro. Não há violonista da minha geração que não tenha dedicado um tempo para tirar de ouvido o seu maravilhoso choro Marceneiro Paulo, hoje um clássico do violão solo brasileiro. O mesmo podemos dizer sobre a valsa Emotiva n°1.

Eu, particularmente, "pirei" com esse disco. Tirei de ouvido (e fiquei muito orgulhoso por isso) o tema Pro Zeca, do saxofonista Vitor Assis Brasil, e os já citados Marceneiro Paulo e Emotiva n°1, do próprio Hélio. E isso no tempo do vinil, em que era muito difícil acertar o lugar da agulha para ouvir novamente um trecho ou um único acorde.

No ano seguinte, no auge da sua maturidade musical, Hélio Delmiro lançou um disco lendário, de audição obrigatória – mesmo - para qualquer músico:  o célebre Samambaia, junto com o pianista Cesar Camargo Mariano. Uma obra de puro bom gosto. A sonoridade e riqueza harmônica desse disco - com seus acordes cheios de tensões e rearmonizações certeiras - influenciou todos os músicos e a mpb em geral, elevando o já alto padrão harmônico da música popular brasileira. E Helio Delmiro estava no meio dessa revolução. Ou melhor, à frente. Esse foi outro vinil que ouvi muito, mesmo, e tirei quase todas as músicas de ouvido. Uma excelente escola. 

No entanto, o fato mais notável da carreira do Hélio é a sua versatilidade e o respeito que conquistou entre os músicos dos diferentes estilos musicais do Brasil, que no geral não se misturam. Enquanto ele tocava jazz como guitarrista do quinteto do Vitor Assis Brasil, tocava violão acompanhando a sambista Clara Nunes. Ao mesmo tempo, tinha o respeito da turma do choro, no geral avessa ao pessoal "do jazz".

Pelo que conheço da carreira dele e dos colegas, ele era o único guitarrista/violonista com bom trânsito e prestígio entre os chorões, os sambistas e os "jazzmen", uma verdadeira façanha, fruto da sua competência como instrumentista e como compositor.

Aliás, falando no Hélio Delmiro compositor, uma das mais belas canções da nossa MPB (e das mais "escondidas" também) se chama Velho Arvoredo é fruto da única parceria dele com o poeta Paulo Cesar Pinheiro, cantada por Elis Regina. Esta música deveria ter saído no disco Essa Mulher, de 1979, e foi preterida de ultimo momento por As Aparências Enganam, de Tunai e Sérgio Natureza.

Ser bom compositor de música instrumental e também de canção é privilégio para poucos. Essa única canção do Hélio com PC Pinheiro vale por uma coleção de dezenas de canções.



Quando um artista como Hélio nos deixa, é comum dizer que seu legado permanece iluminando as futuras gerações. E no seu caso, isso é mais do que verdade. Seu fraseado, seus acordes eram adiantados para o seu tempo, o que lhe garante longa presença e influência entre nós. Sua obra como artista e seus registros com nomes como Milton Nascimento, Elis Regina e Sarah Vaughan, permanecem vivos e inspiradores.

Descanse em paz, Hélio. Sua música continuará a nos guiar e emocionar por muitos anos.

Ajude a preservar a memória da nossa cultura e a riqueza da música brasileira. Faça aqui sua doação.