A Jornada do empreendedor musical no gerenciamento de sua carreira
(Andrea Perrone_Credito Mateus Oliveira)
Por Andrea Perrone
(Especial para o Acervo Violão Brasileiro)
Nos últimos 15 anos, a economia criativa foi um dos setores com maior e mais rápido crescimento na economia mundial. No Brasil, segundo levantamento realizado pela FIRJAN, em 2019, o PIB criativo foi de R$ 171,5 bilhões, enquanto o imobiliário movimentou R$ 170 bilhões. O setor representa aproximadamente 3% do PIB brasileiro, gera 6,6 milhões de empregos e possui mais de 245 mil empresas. Segundo a ONU, mesmo com as dificuldades trazidas pela pandemia, 2021 foi o ano internacional da economia criativa para o desenvolvimento sustentável.
No Brasil, apesar das estatísticas positivas, música e sustentabilidade nem sempre andam juntas. O avanço tecnológico, a assimilação e adaptação das inovações pelo público levaram ao enfraquecimento da indústria fonográfica. A tecnologia abriu portas para que qualquer músico, com poucos recursos, produza seu trabalho de forma independente. Porém, atividades administrativas e organizacionais que anteriormente eram delegadas a agentes da indústria musical, hoje são responsabilidade do músico.
O gerenciamento de carreira é um grande desafio, pois exige conhecimento e treinamento em várias áreas. As academias cumprem seu papel de formar músicos com autonomia de expressão, mas existe um vácuo entre a formação técnica de um músico, a sua entrada no mercado de trabalho e a tão sonhada sustentabilidade.
Leonardo Salazar, durante sua palestra “O Negócio da Música” no Festival de Música de Rua, apresentou a ilustração abaixo, que demostra facilmente a proporção entre talento e gestão de carreira: ela equaciona a carreira musical como o somatório do talento e da gestão de carreira, além de fazer uma correlação com um iceberg, onde a pequena porção de gelo acima da linha d’água é o talento e, o restante, o negócio da música.
Salazar deixa claro que é impossível pensar em sustentabilidade contando apenas com o talento. A música, seja qual for o estilo ou tipo de atividade, exige empreendedorismo como qualquer setor da economia. É a partir da definição de uma meta e do planejamento estratégico que surgem os cases de sucesso. Talento e gestão precisam coexistir em harmonia.
Em 2021, 25% das mais de 500 milhões de músicas disponíveis no Spotify nunca foram tocadas. Triste realidade de músicos que investiram na gravação de um fonograma, mas que não pensaram na tríade produção, distribuição e consumo. Incontestável é que o consumo vem através da conexão do artista com o público e que a internet é catalisadora dessa dinâmica. Se você não estiver presente na plataforma preferida do público, seu trabalho artístico não existe. Mas só estar presente não basta. É preciso chamar atenção e gerar interesse. A ausência de um trabalho efetivo nas redes sociais pode ser um gargalo para a sustentabilidade.
É importante perceber que a obra de um artista é o somatório de um conjunto de detalhes que este representa. É imprescindível determinar e destacar o que torna o seu trabalho especial e diferenciado. Influências musicais podem somar, mas não sufocar sua personalidade; tornando o seu ponto forte a sua marca, o link para criar uma conexão com seu público.
Ter presente quem você é, o que faz, como faz, porque e pra quem é o primeiro passo para estabelecer metas e iniciar um planejamento estratégico. As respostas são diretrizes, definem um foco de atuação e auxiliam na presença e atuação digital de um artista, o tão falado marketing digital.
O público quer ouvir música, assistir vídeos, interagir com o artista, conhecer sua trajetória. Assim é estabelecida a conexão que impulsiona o público a comprar seus produtos (ingressos, discos, aulas, partituras, camisetas, adesivos, financiamento coletivo, etc...). A conta é fácil: se 1000 pessoas gastarem R$ 100,00 por ano com sua música, você terá um faturamento bruto de R$ 100.000,00. Decididamente não é uma meta impossível e já configura a música como uma atividade sustentável.
Muitos confundem trabalho independente com informalidade. Talvez seja o grande erro de uma parcela dos profissionais da cadeia criativa. As oportunidades de negócios aumentam quando o artista se estabelece como um microempreendedor com CNPJ, nota fiscal e conta bancária Pessoa Jurídica. É o caminho para acessar linhas de crédito e também para garantir direito à aposentadoria, auxílio maternidade, afastamento remunerado por doença, isenção de tributos federais como Imposto de Renda, PIS, Cofins, IPI e CSLL. Mesmo com a simplificação do processo de formalização, é comum que profissionais percam oportunidades de trabalho por não possuírem uma conta bancária Pessoa Jurídica. Ainda é comum a compra de notas fiscais. Sabe o que você ganha com isso? Um sócio! A informalidade é mais um funil para a sustentabilidade e uma boa gestão de carreira.
Invista em capacitação. É preciso acompanhar as constantes mudanças do mercado. Conheça seus direitos, estude as leis. Faça parte de uma associação de compositores. É fácil e grátis. Proteja suas obras e seus fonogramas através de registro. Gere seu ISRC e ISWC. Não delegue a outras pessoas essa tarefa, sob pena de dividir os direitos autorais e conexos com terceiros.
Aprenda a fazer bons releases, flyers, EPK (Electronic Press Kit, ou seja, o bom e velho material de divulgação), fotos e vídeos. São itens essenciais numa rodada de negócios e na divulgação do seu trabalho. Anos de estudo e dedicação ao instrumento podem passar despercebidos para um programador cultural caso o release não possua informações essenciais organizadas de forma objetiva.
Como enxergar o potencial de um músico em vídeos/áudios mal captados? Um celular pode produzir bons vídeos, mas existem padrões de captação que determinam a qualidade do mesmo. A internet está repleta de cursos gratuitos que podem auxiliar você até que seja possível pagar um videomaker e uma assessoria de imprensa.
Lembre que você pode planejar turnês, mapear editais e oportunidades de trabalho. Analisar as estatísticas fornecidas pelas redes sociais pode auxiliar o gerenciamento da sua carreira, definindo quem é o seu público, onde ele está e quais as características do mesmo.
Prepare-se: elaborar planilhas de custo e logística farão parte do seu dia-a-dia.
Para finalizar, frequente feiras de negócios no ramo da Música. A conexão entre empreendedores, líderes e programadores culturais potencializa investimentos e oportunidades. Essa participação traz resultados não só financeiros, como se mostra cada vez mais potente, provocando um impacto real na vida das pessoas de toda a cadeia criativa. Essas feiras assumem a tarefa de conectar os diferentes setores da economia criativa, auxiliando o indivíduo a trabalhar em rede, em um ecossistema que gera capacitação, visibilidade e valor para todos.
Boa jornada!